A guerreira ficou em meio à ruína
queimada de seu lar. Todos e tudo o que importava já não existia mais, e ela se
encheu com uma mágoa incompreensível.. E ódio. Ódio passou a ser tudo o que a
motivava. Ela viu novamente o sorriso em seu rosto quando ele deu a ordem. Ele
deveria ser seu protetor, mas cuspiu em seu juramento. Sua família não era a
única dizimada pelo quebrador de promessas. O desejo de ir atrás dele era
forte. Tudo o que ela queria era fincar sua espada no peito dele e assistir a
vida escorrer pelos seus olhos.. Mas ela sabia que nunca conseguiria chegar
perto o suficiente dele. Ele era protegido dia e noite, e ela era somente uma
guerreira. Ela nunca estaria apta a lutar contra seu batalhão sozinha. Uma
morte assim não serviria propósito algum. Ela respirou trêmulamente,
sabendo que não havia volta. A efígie de um homem, formada com gravetos e
barbante, está sobre o armário enegrecido pelo fogo. Seu corpo está envolto em
um pedaço de tecido extirpado do manto do traidor. Ela o tirou do alcance de
seu marido morto. Ao lado havia um martelo e três pregos enferrujados. Ela
coletou tudo e colocou na soleira da porta. A porta já não existia mais,
reduzida a farpas no ataque. Além, ilumidados pela luz da lua, estão os campos escuros
e vazios. Com esforço, a guerreira prende a efígie de gravetos ao batente
superior da porta. “Eu a invoco, Dama da Vingança,” ela disse, com sua voz
baixa, tremendo na profundidade de sua ira. “De além do véu, escute meu apelo.
Surja. Que a justiça seja feita.” Ela preparou seu martelo e o primeiro dos
pregos. “Eu nomeio meu traidor uma vez,” ela disse, proferindo seu nome em voz
alta. Quando o fez, ela colocou a ponta do primeiro prego no peito do vulto de
galhos. Com uma única batida, ela martelou o prego profundamente, prendendo-o
ao batente da porta. A guerreira tremeu. O quarto ficou notávelmente mais
frio. Ou seria sua imaginação? “O nomeio duas vezes,” ela disse, e quando o
fez, martelou o segundo prego ao lado do primeiro. Seu olhar caiu, e ela
cambaleou em choque. Uma figura negra se destacou no campo iluminado pelo luar,
a centenas de metros de distância. Estava completamente parada. Respirando
rapidamente, a guerreira voltou sua atenção à tarefa inacabada. “O nomeio três
vezes,” ela disse, proferindo novamente o nome do assassino de seu marido e
filhos, antes de martelar o prego final. Um espírito ancestral de vingança
pairou sobre ela, enchendo a entrada, e a guerreira cambaleou para trás,
ofegando involuntariamente. A entidade d’outro mundo estava em uma armadura
arcaica, sua carne era translúcida e seu brilho em uma não-luz
espectral. A Névoa Negra a contornou como uma mortalha viva. Com o ranger de
metal tortuoso, a figura espectral tirou a lança enegrecida saliente de seu
peitoral — A arma ancestral que acabou com sua vida. Ela a atirou ao chão
perante a guerreira. Nenhuma palavra foi dita; não havia necessidade. A
guerreira entendeu o que era oferecido a ela — vingança — e sabia do terrível
custo: sua alma. O espírito assistia, sua face impassível e seus olhos ardentes
com uma ira gelada implacável enquanto a guerreira apanhava a arma traiçoeira.
“Eu me juramento à vingança,” disse a guerreira, sua voz trêmule. Ela
inverteu a lança, voltando a ponta para dentro, na direção de seu coração. “Eu
juro com meu sangue. Eu juro com minha alma.” Ela pausa. Seu marido teria
suplicado para que ela não seguisse esse caminho. Ele teria implorado para que
ela não condenasse sua alma com essa decisão. Um momento de dúvida a corroeu. O
espectro imperecível continuou assistindo. Os olhos da guerreira se espreitaram
enquanto ela pensava em seu marido que jazia morto, mutilado por espadas e
machados. Ela pensou novamente em seus filhos, esparramados pelo chão, e sua
decisão se consolidou como uma pedra de gelo em seu coração. Suas mãos se
acirraram ao redor da lança. “Me ajude,” ela implorou, com sua decisão tomada.
“Por favor, ajude-me a matá-lo” Ela chocou a lança contra seu peito,
introduzindo-a profundamente. Os olhos da guerreira se alargaram e ela caiu de
joelhos. Ela tentou falar, mas somente sangue emergiu de seus lábios. A
aparição fantasmagórica assistiu à sua morte, sua expressão impassível. Quando
a última gota de vida escorreu de seu corpo, a sombra da guerreira escalou aos
seus pés. Ela encarou maravilhada suas mãos insubstanciais, e então para seu
próprio cadáver jazendo morto em uma piscina crescente de sangue no chão. A
expressão da sombra endureceu e uma espada fantasmagórica surgiu em sua mão.
Uma ligação etérea, pouco mais que um fiapo de luz, ligou a recém formada
sombra ao espírito vingativo que ela invocou. Através do vínculo, a guerreira
viu a sombra de maneira diferente, vislumbrando a nobre combatente que ela era
em vida: alta e orgulhosa, com sua armadura brilhante. Sua postura era
confiante mas sem arrogância; uma líder nata, uma soldada nata. Era uma
comandante por quem a guerreira prontamente sangraria por. Por detrás da raiva
do espírito, ela sentiu sua empatia — o reconhecimento de sua partilha pela dor
da traição. “Sua causa é nossa causa,” disse Kalista, a Lança da Vingança. Sua voz era fria
como um túmulo. “Agora, andamos o caminho da vingança como uma.” A guerreira
acenou positivamente com a cabeça. Com isso, o espírito vingativo e a sombra da
guerreira adentrou na escuridão e se foi.
"Promessas devem ser mantidas"-Kalista
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